Dominique Gonzales-Foerster – MAM Rio de Janeiro

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Temporama é o título da individual no MAM de Dominique Gonzales-Foerster, artista francesa com residência em Paris e Rio de Janeiro há 17 anos. Curada pelo mexicano Pablo León de La Barra (atual diretor da Casa França-Brasil), trata-se de um exemplo redondo de uma “boa” exposição de arte contemporânea – embora essa noção de “bom” seja difícil de explicar sucintamente no espaço do jornal. A mostra remonta obras realizadas no final dos anos 1980 pela artista, ao lado de poucos e importantes trabalhos recentes, e possui montagem impecável, oferecendo um percurso preciso e a construção de um texto fluido entre as peças, dispostas esparsamente pela ampla sala do Museu sem divisórias nem paredes falsas.O tempo é o grande tema, e como um prólogo somos recebidos na entrada por uma projeção, sobre uma cortina de fitas, da artista vestida como Fitzcarraldo ouvindo ópera e nos convidando a viajar pela temporalidade suspensa da sala.

Ali o visitante se depara com a imensidão do local, ocupado ao centro por uma piscina de superfície azul metálica que se abre no chão negro e profundo. Em suas bordas, outro personagem nos fita: uma Marilyn Monroe com o olhar experiente de quem pôde envelhecer, encarnada de novo por Dominique, mulher de 50 anos apaixonada por literatura e escrita. Considerando esse interesse, pode-se interpretar seus ready-mades, intervenções arquiteônicas e objetos como capítulos de ficções plasmadas em arte visual, fundidas na materialidade do mundo.

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Logo na entrada, uma vitrine traz registros fotográficos antigos das primeiras versões dos trabalhos recriados no MAM, e é tocante reconhecer na exposição essas obras cheias de fôlego, atualizadas com as propostas novas sem apelo nostálgico. Tais peças são provas de um passado que permanece presente não como memória da artista, mas como projeto e possibilidade de olhar, hoje, para um futuro a ser reinventado com sutileza e certo humor.

A instalação de Dominique é para ser percorrida e perscrutada. Ela torna o museu máquina do tempo, aplicando-lhe filtros de cor azul e vermelho nas vidraças para sugerir um efeito 3D. A luz colorida que preenche a sala dá um aspecto artificial, sintético como tudo o que se encontra ali, exceto algumas flores já murchas em um vaso sobre um rádio/relógio que emite som e marca tempo nenhum, e uma pedra que nos observa quieta. Temporama embaralha a paisagem externa, linda e caótica, no interior do edifício de traçado moderno e visionário, sendo uma experiência espaço-temporal construída com elementos da literatura, do cinema e da arquitetura que deve ser vivida.

* Publicado em O Globo, Segundo Caderno, 6/7/2015.

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